quinta-feira, 12 de julho de 2012

Prazer, sou o "velho novo" RAM!



Nessa semana fui buscar na agência dos Correios mais uma obra para a minha singela coleção de cds. Isso se realmente dá para chamar algumas dezenas de cds de coleção... Mas isso não vem ao caso! Não que se trate de um álbum novo, porém, quase novo, ou seja, remasterizado! Mais um daqueles cds que se tu não compras ele insiste em olhar para ti nas lojas físicas ou virtuais. Tem o dom de te chamar pelo apelido mais carinhoso, cativando tanto seu coração como sua carteira. Suas mensagens ficam gravadas eternamente em sua cabeça: “Ei, sou remasterizado! Tenho o som melhor que aquele arcaico que não cansas de escutar! Comigo tu ouves cada instrumento como se a banda estivesse na sua sala. Escuta só: se não comprares rapidamente outro cara virá me comprar...daí ralou! Estarei fora de catálogo!” (É, alguns cds também apelam para o sentimentalismo barato)
Obviamente caí na conversa e não me decepcionei! Hoje sou um ser mais consumista e feliz: tenho o RAM remasterizado do Paul McCartney!
Lançado no mês passado na Inglaterra, o cd ainda demorará um pouco para chegar ao Brasil. E, evidentemente, quando chegar, terá aqui um custo bem mais elevado do que o comprado no exterior (isso contando o frete). Mais uma das nossas incompreensíveis distorções nos impostos sobre cultura, envolvendo cds, vinis, livros, etc.



Paul gravando Ram



Lançado em maio de 1971, portanto, poucos meses após a separação dos Beatles, o RAM sempre ficou no rol dos meus álbuns preferidos do McCartney. Não por considerá-lo uma obra prima (o que no todo ele definitivamente não é), mas por proporcionar algumas canções que ultrapassam o limite da ótima composição chegando quase à genialidade, ponto muitas vezes alcançado por Paul ao longo de sua carreira. É um daqueles álbuns que tu escutas e consegues imaginar algumas das suas faixas em um hipotético disco Beatle.
Com RAM, boa parte composto e gravado na Escócia, Paul McCartney parece ter definitivamente gritado ao mundo que, embora sozinho (a Linda conta?), era capaz de compor músicas tão trabalhadas quanto as dos anos anteriores, mesmo que já há algum tempo Paul já estivesse compondo sem a distinguida parceria dentro do próprio Beatles. Falando na banda, muitas das canções são veladamente direcionadas a seu ex-parceiro John Lennon e à esposa Yoko Ono. Outras promoviam pequenas indiretas aos seus outros companheiros de banda seduzidos, por Lennon, a aceitarem Allen Klein, um empresário falcatrua para gerenciar (desviar mesmo) milhões de libras sem o aquiescência de Paul.


Paul e Denny Seiwell


Contudo, nem só de rancor e ataques se fez o RAM. Parte dele traz um McCartney se redescobrindo como compositor, adicionando elementos musicais e arranjos novos a sua obra, como o baixo rasgado em Smile Away ou a jovialidade da bela Heart of the Country.
Toda a criatividade e originalidade de Paul foram ressaltadas de forma contundente nesse remasterizado. Como em seus lançamentos anteriores, o som ficou bem mais definido, limpo e fácil de “sentir” a execução de cada instrumento.


McCartney concentrado escutando os tapes

A remasterização deixa somente uma tristeza: será impossível resistir aos próximos relançamentos...

Humilde opinião sobre cada faixa do álbum:
Cd 1
1 – Too Many People: O primeiro dardo direcionado a John Lennon e sua amada esposa! Repete Paul McCartney: “Esse foi seu primeiro erro. Pegou a sua oportunidade e a partiu no meio. Agora o que pode ser feito para você?” Crítica reflete visivelmente o momento de sua composição, quando seu ex-companheiro, e a sombra Yoko Ono, vomitava milhares de bobagens sobre os Beatles na imprensa, tentando criar uma nova imagem desvinculada com o passado que havia o consagrado. Uma boa música que conseguiu o primeiro lugar nas paradas britânicas.
2) 3 Legs – Uma puxada blues e um belo violão são os destaques dessa canção. Novamente sua conturbada relação com os ex-companheiros de banda vem à tona: “Quando eu pensava que você era meu amigo, você me decepcionou, me transtornou”. Provavelmente a expressão “3 Legs” se refira a John, Ringo e George. Música boa, nada mais que isso.
3) Ram on – Piano, percussão, ukelele e duas frases: o suficiente para Paul McCartney fazer uma bela canção! A frase “Give your heart to somebody!” é cantada com toda a marca McCartney, acompanhada de belos backings suavizados pelo próprio. Ram on nunca havia sido tocada até poucos anos atrás, quando Paul tirou-a do ostracismo (para deleite de seus fãs mais ligados às músicas menos conhecidas). Tive o prazer de escutá-la em pleno entardecer no Hyde Park, quase não acreditando no que estava presenciando. O termo “Ram on” é alusivo ao pseudônimo “Ramon”, utilizado por Paul em hotéis na época dos Beatles e que, mais tarde, foi influência para o nome dos Ramones.
4) Dear Boy – Um das melhores canções do álbum! Uma levada característica de Paul no piano que faz enlouquecer o ouvinte no primeiro acorde. Entretanto, a maior beleza dessa canção está na genialidade da harmonização vocal, digna do, também gênio, Brian Wilson. Dear Boy poderia facilmente estar em qualquer álbum dos Beach Boys em sua fase mais criativa. Música para “sentir” todos os arranjos propostos por Macca. Defeito: durar pouco mais de 2 minutos...
5) Uncle Albert\Admiral Halsey – Outra canção de destaque do álbum. Uncle Albert parece ter seguido um caminho muito semelhante ao que Paul estava fazendo nos últimos anos de Beatles: duas ou três composições que, se unidas, formam um bom conjunto, variado e, ao mesmo tempo, complementar. Fórmula já utilizada, mas sempre vitoriosa se arquitetada por um McCartney inspirado. Deve ser escutada com mente aberta para o psicodelismo comum ao período. O nome “Albert” refere-se a um tio do compositor.


Paul e seu Rickenbacker

6) Smile Away – Rock and roll básico, na veia e sem frescura alguma! Destaque para um baixo hiper saturado e uma guitarra marcante. Paul no seu estado mais simples, bruto.
7) Heart of Country – Boa canção, quase toda ela centrada em um marcante baixo e um belo arranjo de violão. Espelhava a nova atmosfera que envolvia o compositor: longe da loucura beatlemaníaca, perto de sua família. Dá para imaginar Paul compondo-a em sua pequena casa de campo na Escócia (principal refúgio em sua depressão pós-Beatles).
8) Monkberry Moon Delight – Não tem como escutar e não se impressionar com o vocal extra visceral de Paul McCartney ao longo dos seus 5 minutos! Considerada pela baterista Denny Seiwell como uma das melhores músicas do álbum, Monkberry traz uma certeza: conseguiu-se fazer milagre com a voz de Linda! A companheira de Paul apresenta um backing bastante razoável, superando em muito, o que não é difícil, diga-se de passagem, qualquer contribuição de Yono Ono às gravações de seu marido. Impossível escutá-la e não berrar junto com o Paul! Essencial para o álbum!
9) Eat at Home – Inspiração no rock da década de 50. Elaborou um refrão com andamento que lembra muito o período de composição nos Beatles.
10) Long Haired Lady – Música composta com Linda McCartney. Mais um medley de duas composições que ganhou um arranjo de orquestra em New York. Longe de ser uma grande canção. George Martin faria melhor, bem melhor!
11) The Back Seat of My Car – Simplesmente Paul! Destaque para o simples, mas belo vocal do compositor. “Nós acreditamos que não podemos estar errados”, mais uma frase que Paul exala de forma autobiográfica, acompanhado por um arranjo orquestral certeiro que carrega a canção para um final quase apoteótico.

Paul em ação no estúdio

Cd 2 (bônus)
1) Another Day
2) Oh Woman, Oh Why
3) Little Woman Love
4) A Love for You
5) Hey Diddle
6) Great Cock and Seagull Race
7) Rode All Night
8) Sunshine Sometime

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